Durante três dias do mês de abril de 2014, a cena artística campo-grandense mudou sua configuração, levando mais de cem pessoas ao Ateliê Ana Ruas e ao MARCO – Museu de Arte Contemporânea de Mato Grosso do Sul. Nesses dois espaços deram-se os debates críticos do Seminário e estabeleceu-se um fórum de discussão sobre a arte contemporânea, por vezes vista como algo muito distante das realidades e diferenças culturais regionais brasileiras.
Enquanto projeto contemplado com o Prêmio FUNARTE Mulheres nas Artes Visuais, do Ministério da Cultura e da Secretaria de Políticas para Mulheres, o Seminário foi aberto com uma palestra sobre a relação Mulher, Arte e Beleza na Arte Contemporânea, proferida por Maria Adélia Menegazzo, que destacou o trabalho de artistas mulheres, definindo um percurso a partir do conceito de beleza construído segundo os padrões clássicos, resultando numa representação harmônica e equilibrada do corpo feminino, até a configuração de uma mulher desdobrada que não se submete ao estereótipo e que se apresenta criticamente frente a seus afazeres e afetos, numa sociedade de consumo. Aline Figueiredo, curadora, crítica de arte e historiadora, falou sobre A Descentralização da Arte Brasileira via MT/MS, enfatizando, principalmente, suas ações na criação de grupos de artistas e atelieres livres nos anos 70 e 80, que constituíram uma visualidade local e difundiram a arte regional para outros estados brasileiros. Artistas mato-grossenses e sul-mato-grossenses foram apresentados de forma panorâmica por meio de suas obras e poéticas. Marília Panitz enfocou a relação entre a arte e a palavra na obra de três artistas brasileiras, revelando o artista como leitor e o texto como o objeto que instaura seus fluxos a partir dos elementos da tradição, paradoxalmente refazendo-os por meio de fraturas e rasuras.
No Ateliê Ana Ruas, no período noturno foram realizados encontros com artistas e suas obras. O primeiro contou com a artista brasileira Lúcia Koch, que apresentou e discutiu a própria obra como resultado de um processo reflexivo que relaciona arte e espaço arquitetônico. Enfocando basicamente suas instalações, a artista falou da arte como objeto de mediação entre o homem e o espaço construído, como fator essencial para sua desautomatização. Propôs ao público compreender a experiência estética, individual e coletiva como elemento humanizador na percepção do espaço. Saletti de Abreu Barreto e Sandra Tucci trouxeram para discussão a experiência do Collegio das Artes, de São Paulo, com a “Incubadora de criação”, voltada para formação do artista, formação de repertório e referências, elaboração, desenvolvimento e acompanhamento de projetos e exposições. Saletti enfocou principalmente o papel da pintura e do desenho como ponto de partida para a elaboração dos projetos e das poéticas individuais. E fechando o Seminário, a artista Leda Catunda falou sobre Percurso da obra de arte e Processo criativo, voltando as reflexões para sua própria produção. No encerramento das atividades no MARCO, ocorreu o “apagamento” da intervenção realizada em 2004, pela artista Ana Ruas, na espiral que conduz ao subsolo do museu. A participação no apagamento foi liberada ao público, numa ação complementar às discussões sobre as práticas artísticas contemporâneas assentadas sobre o transitório e o efêmero, a liberdade e o controle, o espetáculo e a sedução.
O Seminário Entre Vários Olhares – da Pintura à Intervenção revelou-se como um importante movimento na busca do exercício reflexivo das práticas artísticas e da necessidade de investimento na formação de público para a arte contemporânea.
Maria Adélia Menegazzo, Campo Grande/MS
Professora da UFMS e crítica de arte – ABCA/MS
Abril de 2014