Ana Luisa Ruas é natural de Lagoa vermelha, RS, e formada pela Universidade de Passo Fundo,RS. Durante 6 anos morou em São Paulo e em 1996 radicou-se em Campo Grande, MS,no cenário das artes locais. Sua pintura recobriu telas e também grandes superfícies de alvenaria e concreto. Assim, este texto é dedicado às suas intervenções pictóricas sobre muros e viadutos desta cidade.
A pintura mural é a mais antiga representante da arte como registro.Desde as pinturas parietais nas cavernas pré-históricas até o período dos grandes afrescos renascentistas, os muros vêm registrando e informando sobre fatos, símbolos e valores sócio-culturais de diferentes períodos.
O desenvolvimento da imprensa, a tela pintada e,mais tarde, os meios de comunicação de massa romperam com a tradição documental dos muros pintados. Mas, o engajamento social da arte em meados deste século promoveu a retomada da pintura mural. Diego Rivera, Cândido Portinari e Pablo Picasso foram artistas contemporâneos que se ocuparam com essas grandes dimensões parietais.
O conceito de quadro pintado prevaleceu na retomada do muralismo, recortando o plano de parede com descrições, narrativas e abstrações pictóricas, cuja ordenação não dependia do ambiente ao seu redor. As tentativas de integração entre o plano mural e o ambiente ficaram então a cargo de designers, arquitetos e decoradores.
O trabalho que Ana Ruas realizou nesta série de murais propõe a reflexão sobre os limites definidores entre a arte e o design, porque a intenção decorativa é presente e acentuada nas suas composições. A arte de rua de Ana Ruas é de fácil apreciação, induzindo o espectador ao rápido encantamento visual e até a participação.
Todavia, a fácil apreciação foi sendo obtida através de complexas relações cromáticas,espaciais e conceituais, indicando uma composição inteligente, produto da percepção apurada e da capacidade de planejamento estético da artista.
A representação das sombras é revelada do hábil domínio da linguagem visual, pois nas composições geométricas o efeito de luz e sombra é utilizado para criar ilusão espacial, perspectiva. Entretanto, nas composições mais naturalistas, orgânicas, as mesmas sombras servem para negar a ilusão do espaço natural. Algumas pinturas mostram folhas sendo levadas pelo vento, como uma referência ao espaço natural. Porém, as sombras pintadas sob cada uma das folhas denunciam a existência do muro, porque são projetadas sobre ele.
O jogo conceitual com a sombra representada acontece novamente na pintura da silhueta do poste sobre o muro azul, congelando um momento do dia. Tempo e espaço foram sendo reinventados por um trabalho que procurou manter uma sábia relação com as cores, as formas e outros elementos de seu entorno.
Em questão crucial distingue as intervenções de Ana Ruas daquilo que foi convencionado para a pintura mural, porque seu trabalho ultrapassa as molduras de um único muro, vai além do quadro mural, compondo-se como espaço, como ambientação relacionada com o entorno e rebatida em outros muros, outros mundos vibrantes em cores e poesia. Foi embora para Pasárgada com Bandeira nas mãos.
Richard Perassi
2001