Era uma vez, 2008

ERA UMA VEZ...

Contar histórias talvez seja o que há de mais universal na relação entre os homens e desde sempre. Ao enunciarmos “Era uma vez...”, conduzimo-nos, e a quem nos ouve, para outro tempo, outro espaço, quando e onde tudo é possível. Criamos mitos, histórias narradas buscando a explicação de determinados acontecimentos por meio do exercício da imaginação.

Nesta individual, Ana Ruas apresenta histórias que certamente ouviu contar, recortando elementos de fácil identificação, submetendo-os a um processo particular de tradução. Da narrativa literária para a narrativa visual, plástica, resultado da manipulação de signos e objetos conservados pela memória afetiva, a artista abre para o observador a possibilidade de recuperar a própria história de leitura. Espelho, espelho meu! Quantos sapatos de cristal foram quebrados nos jardins da princesa que adormeceu pela maçã envenenada? Quantos sapos se transformaram em cavaleiros que salvaram crianças perdidas na floresta? As belas tranças alçaram o príncipe valente à torre mais alta diante da fera que conduziu um gato de botas aos braços de mamãe gansa...

Não importa o percurso que venhamos a adotar para reconstruir cada pedaço da nossa história pessoal de leitura, ele certamente estará perpassado por uma dessas narrativas. Nas telas, Ana Ruas acentua esta eterna presença utilizando, por exemplo, cores fortes, apaixonadas, visualmente provocantes, como a combinação do rosa, com o vermelho e sua complementar, o verde, os vários tons de azul, que saltam em nossa frente e nos obrigam a ver suas máscaras, recortes e colagens. Ou, por outro lado, introduz o branco, velando a superfície do espelho que perde a capacidade de refletir a imagem e ganha a possibilidade de ser novamente interrogado, (não mais pela madrasta), mas por flores e maçãs.  Embora a moldura dos espelhos aponte limites, a superfície vai além, dobrando-se no espaço infinito. O suporte também conta histórias. Uma toalha de mesa bordada na infância, o colorido ou a estampa de um tecido, recortada e colada sobre a superfície da tela, transformam-se em pontos de partida para a criação de um universo plástico-narrativo à beira do kitsch. O valor retórico de todos estes elementos é evidente: apelam à sensibilidade disponível do leitor para a construção de sentidos.

É só ouvir: Era uma vez...Once upon a time...Il était une fois...C’era una volta...Era una vez...não importa. Tudo convida ao jogo e à troca de experiências.

Maria Adélia Menegazzo

UFMS/ABCA

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